sábado, 31 de agosto de 2013

Quando a cidade enxerga o campo


Muito mais preocupado com as metas e os resultados a serem alcançados, os habitantes da cidade vivem em busca da produtividade, do lucro e do consumismo. Dia e noite fixados no trabalho perdem com freqüência o foco e deixam a vida passar, não percebem que os filhos cresceram sem saber quase nada sobre o universo rural, até mesmo porque eles mesmos desconhecem. Quando chega o período de exposições, principalmente a Expointer, alguns pais urbanos levam os filhos para um passeio na feira, neste dia muitos ficam sabendo que o leite tomado diariamente vem da vaca e não da “caixinha do supermercado”.

É quando a cidade enxerga o campo, ou melhor, do jeito que a mídia vende o rural. Sem querer generalizar, as notícias mais impactantes são os campeões ou as campeãs, a vaca que mais produz leite, o touro mais pesado e valioso, a raças de ovelhas de melhor aptidão, o vencedor do freio de ouro, o faturamento na venda de máquinas dos animais. Reportagens mostram a vida de peão na feira e não nas propriedades, a estética dos bichos ao ingressar na pista, o maior e o menor animal da feira, o modo de vestir dos homens e mulheres “na feira”, uma ou outra novidade de funcionamento da exposição ou de programas governamentais.

Segundo histórico da Expointer, a tradição do Estado em feiras agropecuárias vem desde 1901, quando em pavilhões fechados no Campo da Redenção, hoje área do Parque Farroupilha e do campus central da Ufrgs, em Porto Alegre, ocorreu a primeira Exposição de Produtos do Estado. Em 1972, já em Esteio, foi realizada a primeira Exposição Internacional de Animais, a Expointer, com a presença dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Santa Catarina e Paraná. Países como Canadá, Holanda, França, Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Áustria, Suécia, Dinamarca, Bélgica, Uruguai, Argentina e Chile também estavam presentes.

Nos últimos anos na feira, o público de freqüentadores pagantes chegou perto de 500 mil, foram arrecadados quase 12 milhões na venda de animais, o setor de máquinas faturou mais de 830 milhões e a agricultura familiar superou 1 milhão em vendas. Estes, embora sejam dignos representantes do campo, não ocupam muito espaço nas divulgações da feira. Sem falar no artesanato rural, nos outros animais e na mostra de serviços essenciais ao meio rural.

Mesmo com números fantásticos e quebra de record’s ano após ano e a visibilidade na mídia, eu chego a conclusão que a cidade ainda não enxerga o campo. Os agropecuaristas persistentes que trabalham sem serem vistos ou aqueles competitivos, que mesmo não ganhando nada estão lá, participando, também estão invisíveis. Para as pessoas da cidade que desejam enxergar o campo, sugiro que façam um roteiro turístico no meio rural aí do seu município. Provavelmente, muitos que trabalham na roça não serão vistos pela falta de inclusão social, mas se quiserem uma referência grandiosa, então visitem a Expointer.


Marco Medronha    mmedronha@hotmail.com

sábado, 17 de agosto de 2013

Capão da Amizade


Capão é uma formação vegetal típica da região Sul do Brasil. Para quem é do meio rural, provavelmente conhece como um “mato pequeno” isolado ou agrupados em meio aos campos. No novo Dicionário da Língua Portuguesa, segundo Ferreira (1986),  diz que capão “Consiste em um grupamento de vegetação arbórea cercada por campinas”. Grande ou pequeno, ele já deu nome para alguns municípios do Rio Grande do Sul. Temos, por exemplo: Capão do Leão, Capão da Canoa, Capão do Cipó, Capão Bonito do Sul e Muitos Capões. 

Relembrando os tempos de guri, quero falar de um capão que conheci e pude vivenciar o crescimento de uma comunidade em sua volta, o Capão da Amizade, no município de Cristal. Um mato de formato arredondado, de vegetação variada, entremeada com pedras grandes e pequenas, onde algumas delas são suportes para  crescimento de árvores que derramam suas raízes sobre as pedras, formando desenhos e arranjos tão belos que só a natureza proporciona. Na lembrança tenho na memória uma floresta, pois o capão, como era chamado, parecia um mato muito grande, no qual me deliciava ao sentir o frescor da relva, em subir nas árvores, nas pedras, se embalar nos cipós e até mesmo levar pra casa, barba-de-pau para enfeitar o pinheirinho no natal.

Nunca deixei de visitar o Capão da Amizade e num dia desses estive lá. Fiquei feliz ao vê-lo preservado, com calçadas e ruas de concreto ao seu redor. A comunidade, formada pelos órgãos públicos e seus habitantes, entendeu que aquele capão é um patrimônio com valor ambiental e cultural, faz parte da história dos cristalenses. Durante muitos anos, na formação do povoado até passar a categoria de vila, as festas realizadas no Capão da Amizade ergueram, entre tantas obras, as igrejas, escolas e salões comunitários. Das festas mágicas do Capão surgiu a amizade entre as pessoas e a vontade de estarem próximas na construção de uma cidade, que bem poderia se chamar Capão do Cristal. 

Bons tempos aqueles... em que as pessoas se encontravam para conversar e  juntas buscavam o entendimento. Compadres e comadres se respeitavam e trabalhavam pelo bem comum, sem reclamar. E tinha também muita diversão: O jogo da argola, do porquinho da índia, do tiro ao alvo, da roleta de prêmios, da pescaria na caixa de areia, da banda tocando, dos barris de chopp, dos sucos e guaranás. Um palco feito de tábuas plainadas era o espaço das apresentações artísticas, onde gaúchos e prendas dançavam nossas melhores canções folclóricas. Sem esquecer que pelos caminhos de subidas e ladeiras, sob um teto de folhas, desfilavam rapazes e moças à procura de um olhar insinuante a fim de começar um namoro ou uma simples e sincera amizade.

Muitas pessoas que conheceram e passaram pelo Capão da Amizade, possivelmente vão lembrar com carinho daquele lugar. Em outras, o sentimento pode ser de medo quando passaram pelo mato na noite  escura. Para alguns, mesmo em  dia claro, o capão  nada representa, talvez por não terem vivido numa época que mesmo na simplicidade as pessoas eram evoluídas e os contatos pessoais eram mais importantes.


Marco Medronha    mmedronha@hotmail.com

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Dialogando com a comunidade rural


O diálogo pode ser considerado um caminho seguro para o entendimento entre as pessoas e a descoberta de novas realidades. Caracterizado pela conversa entre dois ou mais indivíduos, onde o consenso prevalece, a conversação estabelecida é processo propulsor de troca de ideias e alternativas para resolução dos problemas. A criação do diálogo veio do teatro em substituição ao monólogo, a compreensão dos fatos históricos pelo colóquio, no sentido de informar as pessoas sobre o presente é também uma estratégia de comunicação poderosa.

Um programa chamado “Dialogando com a Comunidade”, realizado no município de São José do Norte, utiliza a lógica do diálogo para promover o desenvolvimento técnico e social das comunidades rurais. Através do calendário de visitas, um grupo formado por extensionistas da Emater/RS-Ascar e secretarias municipais da Prefeitura passam o dia conversando com as famílias rurais, onde o propósito é ouvir primeiro todas as demandas, conhecer os problemas e as potencialidades, com o objetivo de elaborar um plano de ação com foco nas ações prioritárias.

Em outra etapa do programa, o grupo realiza novas reuniões com a comunidade onde o momento é de apresentar, discutir propostas para planejar avanços nas áreas de produção da agropecuária, melhorias sociais e culturais. Recentemente acompanhei um dia desses na Comunidade de Capela e pude comprovar o resultado das ações quando a origem vem do diálogo. Parece elementar que para avançar nos processos democráticos, verdadeiramente comunitários é preciso conhecer realidades, mas infelizmente isso na prática não acontece, pois as chamadas “políticas públicas” vêem quase sempre de cima para baixo sem dar ouvidos para aqueles que mais precisam se expressar.

No que se refere à comunhão fática, esta forma de discurso entendida como diálogo, preenche uma função social e esse deve ser o principal objetivo. Recordando os conceitos de Benveniste (2006), “A conversa, por exemplo, é um gênero bastante desprestigiado nas teorias discursivas, isso porque conota temas aleatórios, desnecessários e que, por isso, não produzem resultados concretos”. 

Concluo afirmando que, este tipo de proposta de trabalho não é nenhuma perda de tempo, ao contrário só existem ganhos e maiores chances das políticas darem certo, além de produzir resultados satisfatórios para realmente “todos”.

Marco Medronha    mmedronha@hotmail.com 





quarta-feira, 31 de julho de 2013

A imitação da vida

Foto: Linda Tiepelman

Cada vez fico mais convencido de que as respostas que precisamos para os problemas da vida contemporânea encontram soluções nos milhões de exemplos mostrados pela natureza. E não estou me referindo somente às conseqüências para a saúde, como o consumo inadequado de alimentos, a intoxicação por venenos, o uso de drogas sintéticas, estresse ou outros males da vida moderna. Falo de uma ciência que tem como objetivo estudar as estruturas biológicas e suas funções, a qual procura aprender com a natureza através de observações, estratégias e busca de soluções.

A biomimética é uma recente área do estudo científico que provém da combinação de duas palavras gregas bíos, que significa vida e mímesis que significa imitação. De forma direta podemos dizer que é o domínio do estudo que promove a imitação da vida. Sem mesmo que nos demos conta, a ciência está presente nas tecnologias inovadoras que experimentamos ou vivenciamos. Quando nos deslumbramos com uma obra fantástica da arquitetura em forma de espiral, caracol ou cupim, lá está a ciência que imita a vida. 

As abelhas e suas formas organizativas deram origem às conexões dos computadores, as asas do beija-flor inspiraram as hélices dos helicópteros e por aí se vão inúmeros exemplos. Muitos outros produtos criados a partir das observações da natureza trouxeram avanços inestimáveis à medicina, por exemplo. Um deles é o biofilme, tecido inspirado na pele do tubarão que evita a infecção hospitalar. Outros exemplos, alguns que conhecemos bem estão em destaque:
Velcro - Desenvolvido a partir de 1941, pelo engenheiro George de Mestral a partir da observação de sementes de grama dotadas de espinhos e ganchos que se prendiam nos pelos de seu cão; 
Superfícies de baixo atrito - Inspirada na forma como a pele dos peixes reage ao contato com a água, essa tecnologia, aplicada ao seu traje de natação, ajudou o nadador Michel Phelps, em suas conquistas nas piscinas. A mesma tecnologia tem sido aplicada também em cascos de navios, submarinos e mesmo aviões; 
Telas "asa-de-borboleta" - São superfícies de visualização de baixíssimo consumo de energia, baseadas na forma como as asas de borboletas refletem a luz; 
Efeito lótus - Baseado na forma como as folhas do Lótus repele a água e a sujeira, diversos produtos estão sendo desenvolvidos na indústria para aplicação em tecidos, metais, pára-brisas e faróis de automóveis.

Estes, embora valiosos, são pouquíssimos exemplos diante do gigantesco potencial que a biomimética tem para oferecer como resultados. Existe na natureza trilhões de espécies das quais menos de dois milhões foram catalogadas até agora. Então eu pergunto: Se nos sistemas biológicos são encontrados as resoluções de problemas da engenharia, da física, da química, da arquitetura, da informática, porque  os avanços da tecnologia na produção de alimentos imitam tão pouco a natureza? 

Marco Medronha   mmedronha@hotmail.com


sábado, 27 de julho de 2013

Obrigado agricultor!


Os agradecimentos deveriam começar logo pela manhã ao sentir o cheirinho de café passado na hora e aquele pão quentinho com a manteiga derretendo sobre ele. Hummm... Que delícia! Com os sentidos aguçados saboreamos a primeira refeição do dia e saímos apressadamente para o trabalho sem ao menos lembrar que por traz daquela primeira e necessária alimentação, está o trabalho de um agricultor.

O dia continua e gastamos energias no escritório, nas fábricas, no comércio, na construção civil, nas plataformas de petróleo, nas academias, nas escolas, no esporte, na balada, no trânsito, no legislativo, no executivo, no congresso, na carga e descarga de alimentos... E nem mesmo neste momento, na hora do almoço, lembramos de agradecer a quem de direito, pelo feijão, arroz, ovo, carne, hortaliças e frutas, óleos e temperos que degustamos e nos regozijamos diariamente.

A noite ainda não chegou e já estamos pensando na janta, a última refeição do dia. Pode ser algo leve como uma sopa de legumes, um churrasco entre amigos depois jogo de futebol ou apenas uma pizzaria pra comemorar os resultados do trabalho, ou ainda, um chopp com colegas para desopilar e jogar conversa fora. Lugares onde se fala de tudo, mas não lembramos jamais que por traz muitos momentos nossos de prazer e felicidade está o trabalho de um agricultor.

Não preciso dizer que o agricultor é uma figura estereotipada como alguém sem cultura, que trabalha na roça e muitas vezes é motivo de chacota na cidade. Mas chamamos de agricultor, aquele que prática a agricultura e pecuária e que produz alimentos para nutrir as populações. Desta forma, o valor do trabalho do agricultor deve ser, no mínimo ensinado às nossas crianças, para que elas não cresçam pensando que leite e ovos saem das caixinhas e, que o arroz e feijão vêem das prateleiras dos supermercados.

Em 28 de julho, dia do nosso agricultor é fundamental que tenhamos consciência da importância dessa figura humana em nossas vidas e, que saibamos valorizar e agradecer quem está nesta profissão. Afinal, pelo menos uma vez no ano precisamos de um médico, um advogado, um arquiteto, do dentista, do taxista ou do enfermeiro, por exemplos. Mas, três vezes por dia precisamos de um colono agricultor.



Marco Medronha     mmedronha@hotmail.com

domingo, 14 de julho de 2013

Novelo de lã


Nos caminhos de várias propriedades rurais de municípios como Canguçu, Piratini, Herval, Pinheiro Machado, Pedras Altas, Pedro Osório, Cerrito, Arroio Grande, Jaguarão e outras tantas localidades da Zona Sul do Estado, é comum ver famílias tecendo fios e fazendo do artesanato em lã muito mais do que uma fonte de renda, mas sim encontrando na atividade formas de terapia e uma maneira de serem incluídas socialmente.

Vejo em um “novelo de lã”, um emblema de virtudes e oportunidades para muitos pecuaristas familiares desta região. Para chegar à condição de estar ali, enroladinho e pronto para a transformação, o novelo teve um passado de trabalho e dedicação dos autênticos pastores do sul do Brasil. Pois, eles seguiram o dom dos ancestrais e continuaram o legado de fazer do pampa, um lugar para criar ovelhas, ter carne de qualidade e tirar a lã para tecer os fios, que irão virar peças do vestuário usadas por grande parte dos gaúchos.

Nesta atividade de tecer os fios, estão principalmente as mulheres do meio rural, as artesãs encontraram nos novelos de lã, a oportunidade de mostrar seu valor na propriedade. Primeiro, elas sensíveis e boas estrategistas que são, foram se organizando em grupos, saindo para feiras e exposições com a finalidade de mostrar e vender suas peças. Os homens pagaram para ver e viram, em pouco tempo o artesanato segurava as pontas na propriedade rural e, muitas vezes tornou-se a principal fonte de renda.

O certo é que as famílias que se dedicaram a ovinocultura e não esmoreceram diante das dificuldades encontraram a fórmula do “novelo de lã”, eles souberam dar valor ao trabalho agregado e apostaram na criatividade que vem da arte de tecer. Enquanto as agulhas se entrelaçam na construção de novas peças, o pensamento voa. Acho até que famílias artesãs, inconscientemente, praticam uma das lições deixadas por Charles Chaplin: “A persistência é o menor caminho do êxito”.



Marco Medronha     mmedronha@hotmail.com

sábado, 6 de julho de 2013

Família: O conceito gerador de resultados

oglobo.globo.com

Um exemplo recente sobre os resultados da utilização do conceito de “família” foi a recuperação de prestígio do futebol brasileiro com o título da Copa das Confederações, um torneio organizado pela Fifa, de quatro em quatro anos, onde os participantes são os seis campeões continentais, mais o país sede da Copa do Mundo e o último campeão mundial, perfazendo um total de oito países. A copa deste ano, 2013, foi vencida de forma incontestável pela nossa seleção, graças à capacidade de formar grupo do gaúcho Scolari.

Felipão, como é conhecido carinhosamente pelo povo brasileiro, adotou uma postura de paizão, mas um pai de família zeloso que cuida de todos os detalhes que podem fazer um grupo vitorioso. Por exemplo, oportunidades iguais para aqueles que estão merecendo; elogios em público para incentivar quem trabalha bem; chamar para uma conversa reservada quem precisa render mais; não expor seus filhos e protegê-los sempre dos ataques maldosos ou especulações; ensinar lições de patriotismo, como saber cantar o hino nacional; Tirar lições nas derrotas e ser humilde nas vitórias; entre outros tantos aconselhamentos familiares.

Assim como nosso técnico estrategista, existem inúmeras empresas rurais e urbanas, que aplicam os conceitos de base familiar, onde o compromisso de todos é fundamental. O ataque ajuda a defesa e esta também se soma ao ataque, todos zelam por seus setores, pois sabem que os resultados viram se cada um der o melhor de si. O que digo parece discurso pronto dos jogadores de futebol, em suas entrevistas, mas sei que nem sempre a fala condiz com a realidade dos bastidores. A prática deve ser coerente com o discurso e falar com firmeza e carinho, parece ser um rumo a ser seguido por dirigentes de empresas familiares, em qualquer setor.

No conceito familiar devemos lembrar sempre dos consumidores, pois é deles que depende o sucesso do nosso negócio. No caso do futebol, Felipão, em suas entrevistas, lembrou das manifestações de apoio da torcida à Seleção Brasileira e repartiu com sua comissão técnica as glórias recebidas por suas vitórias.  Da mesma forma o produtor, cidadão ou empresário de um empreendimento familiar deve lembrar que, os resultados positivos vêem de aconselhamentos técnicos que temos pela vida. Pode ser um amigo, uma instituição ou mesmo alguém da família que passou pela experiência.

O conceito de família é gerador de resultados e com ele é possível ganhar uma nação.


Marco Medronha      mmedronha@hotmail.com