segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Humildade

Nesta semana visitei Santana da Boa Vista, município em que foi realizado um curso para educadores, lideranças locais e agricultores familiares sobre o tema biodiversidade. Conhecer a realidade local da flora, fauna, bem como  aspectos culturais, sociais e econômicos com vistas a a presenvação e produção sustentável  foi  a ideia central da capacitação. A Serra das Encantadas possui formações rochosas e vegetação variada, rica para o estudo do Bioma Pampa.
Entre tantos temas relavantes do curso, que prevê também o auto conhecimento, um pensamento gravado a ferro quente em um couro bovino, na entrada do Galpão Anita Garibaldi, chamou-me a atenção: “Ao entrarmos neste galpão pendura no cabide de tua humildade, tuas diferenças e preconceitos e se mesmo assim preservares algum orgulho, que seja o de ser gaúcho”. Para mim ali estava a primeira lição para quem vai participar de algum grupo onde a troca de conhecimentos é fundamental na construção de um aprendizado consciente.
Ao buscar mais significados para humildade, investiguei dicionários e descobri por exemplo, que o termo humus vem do latim  e significa "filhos da terra". Refere-se à qualidade daqueles que não tentam se projetar sobre as outras pessoas, nem mostrar ser superior a elas. A Humildade é considerada pela maioria das pessoas como a virtude  que dá o sentimento exato do nosso bom senso ao nos avaliarmos em relação às outras pessoas. Tais características são marcas atribuídas ao povo gaúcho e principalmente a aqueles que moram no campo, qualidades como a cordialidade , o respeito , a simplicidade e a honestidade .
Poderia trazer para reflexão personagens famosos, os quais  através dos tempos registraram em textos, escritos marcantes sobre a humildade. Mas prefiro relembrar a contribuição de alguém mais próximo do nosso tempo, a brasileira Cora Coralina, poetisa e cientista considerada uma das mais importantes escritoras do nosso País. A mulher simples do meio rural deixou seu legado literário escreveu, em forma de oração:

Humildade
Senhor, fazei com que eu aceite
minha pobreza tal como sempre foi.

Que não sinta o que não tenho.
Não lamente o que podia ter
e se perdeu por caminhos errados
e nunca mais voltou.

Dai, Senhor, que minha humildade
seja como a chuva desejada
caindo mansa,
longa noite escura
numa terra sedenta
e num telhado velho.

Que eu possa agradecer a Vós,
minha cama estreita,
minhas coisinhas pobres,
minha casa de chão,
pedras e tábuas remontadas.
E ter sempre um feixe de lenha
debaixo do meu fogão de taipa,
e acender, eu mesma,
o fogo alegre da minha casa
na manhã de um novo dia que começa.”
Cora Coralina

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

O Nascimento do Guri

Numa cidade da Zona Sul, o agricultor José Brasil trabalhava como carpinteiro. O ofício que escolheu para sustentar a família, não era suficiente para o viver dignamente, pois era obrigado a pagar pesados impostos ao governo a fim de manter-se dentro da regularidade. Ele tomou a decisão de voltar para o campo e rumou para as suas terras, as quais estavam arrendadas a um parente, afim de retomar sua antiga profissão. A esposa, Maria esperava pelo nascimento de um menino.
Os amigos e compadres, Zacarias e Isabel foram solidários e, emprestaram-lhes o velha camionete Rural Willys, onde coube toda a mudança de José e Maria. O casal rumou pela estrada poeirenta do interior com um novo sonho: Cultivar a terra com sustentabilidade, produzir alimentos saudáveis para alimentar  a família, vender o excedente e criar os filhos dentro das leis de respeito à natureza e o meio ambiente.
Para a realização de sonhos é preciso sacrifícios e determinação, a familía enfrentou dificuldades na viagem de volta. Além das condições ruins do veículo, que estragou e das estradas esburacadas, Maria já sentia as dores do parto, a criança estava pra nascer. Em volta, só campo e animais foi quando José avistou uma casinha abandonada, uma típica tapera com um pomar de pêssegos improdutivo. Foi ali que o Guri enrrolado em um ponche nasceu, a cama era um pelêgo. Em sua volta os bichos de criação: ovelhas, cabras, vacas, porcos e até um cusco guaipéca fazia festa com os outros animais.
Aquele movimento chamou atenção do repórter Gabriel, que passava de motocicleta pelo local rumo ao trabalho em sua rádio comunitária. Ele reconheceu a família abençoada, como antigos vizinhos do lugarejo e através do microfone anunciou: “Bom dia amigos e amigas... Hoje, dia 25 de dezembro é um dia feliz para nossa comunidade, José e Maria voltaram, junto com eles uma criança que irradia luz, um Guri com brilho diferente.
Os moradores do lugarejo ouviram o anúncio do rádio e correram para a tapera abandonada, com a finalidade de auxiliar e saudar o retorno dos velhos  amigos. Todos louvaram o menino, como sinal de esperança e renovação.
A semelhança dessa história e das personagens, com o nascimento do menino Jesus, não é mera coincidência. Feliz Natal aos leitores do Repórter Rural.

Marco Medronha   mmedronha@hotmail.com

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Associação do conhecimento


Exemplos de associações com pessoas que se agrupam para superar desafios são comuns e conhecidas como práticas antigas no mundo social, embora cada nova  forma associativa tenha suas peculiaridades e venha soar como novidade para os indivíduos de um grupo. A associação é uma estratégia de fortalecimento das minorias para enfrentamento das desigualdades, inclusive entre os outros animais.

De uma maneira geral, a associação é qualquer iniciativa formal ou informal que reúne pessoas físicas ou outras sociedades jurídicas com objetivos comuns, visando superar dificuldades e gerar benefícios para os seus associados. É também caracterizada como uma forma jurídica de legalizar a união dos sócios para conseguir recursos na aquisição de bens e serviços que possam trazer a melhoria da qualidade de vida e o bem estar coletivo.

No meio rural as associações permitem a inclusão social de muitas famílias no mercado e através delas a possibilidade de comercialização de suas produções. Conheci na localidade de Alto Bonito, uma associação que possuía algo diferente: A associação do conhecimento. Os produtores rurais desta região possuem em comum a pecuária familiar e através da associação compram insumos e vendem o gado. Mas afinal, onde está a diferença? Está no processo de criação dos animais em uma área biodiversa, onde técnicos e produtores manejam o gado com base na observação dos fatores naturais da flora, fauna e clima.

No trabalho da Associação dos Produtores do Alto Bonito, não existe hierarquia de conhecimentos dos facilitadores do processo, pesquisadores da Embrapa ou dos extensionistas da Emater/RS, sobre os agricultores. Existe uma união de conhecimentos históricos adquiridos pela comunidade com as ciências agrárias a serviço do respeito à biodiversidade de cada local. Os agricultores passam a conhecer melhor a sua área e realizam o manejo com o gado respeitando cada especificidade, ao mesmo tempo que compartilham com os demais associados e técnicos.

Os resultados são consistentes e ajudaram manter a integridade do Alto Bonito, entre eles: A preservação os recursos naturais da região; A auto capacitação dos agricultores familiares; A democratização do conhecimento; O fortalecimento da comunidade;  A melhoria da qualidade de vida dos associados através da compra conjunta de insumos e comercialização da pecuária.

Alto Bonito pertence ao município de Pinheiro Machado e faz parte da chamada Serra do Sudeste, diversa em formações vegetais devido, especialmente, à sua variação geológica. Destacam-se afloramentos rochosos, considerados de extrema prioridade para a conservação.


Marco Medronha     mmedronha@hotmail.com

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Senhas



Um dia desses precisei digitar uma senha e não lembrei da combinação, após tres tentativas frustradas bloquei a conta. Isso possivelmente já tenha acontecido com você,  o inconveniente de ter esquecido os digitos da senha. Nada anormal, pois com tantas combinações que utilizamos diariamente... Eu mesmo contei pelo menos 20 senhas que utilizo com frequência: Senhas de bancos, do computador, do facebook, do msn, do skipe, do cartão de crédito, do alimentação, do combustível, do cadeado e lá se vai. Muitas dessas dobradas, com letras e números.

No conceito tradicional, senha é uma palavra ou código secreto previamente convencionado entre as partes como forma de reconhecimento. Em sistemas de computação senhas são amplamente utilizadas para autenticar usuários e conceder-lhes privilégios — para agir como administradores de um sistema, por exemplo — ou permitir-lhes o acesso a informações personalizadas armazenadas no sistema. No meu entendimento a senha é um conjunto de carecteres combinados (letras e números) utilizados para acessar bens,  serviços, buscar informações e até para comunicar-se, acreditem. As pessoas hoje, mesmo no mesmo ambiente, conversam pelas redes sociais.

Como era a vida antes das tecnologias da informação? Na contemporaneidade vivemos cercados de números e letras e, necessariamnete as ações implicam no uso de senhas para chegar a um objetivo. Com certeza vivemos tempos de relações frias, mediadas  por códigos de defesa para proteger o cidadão em seus atos rotineiros. A senha é pessoal, intranferível  e foi criada para dar segurança ao usuário. Por isso, existe o conceito de senha forte ou fraca, quanto mais complexa, mais impessoal, menos possibilidade de ser violada.

Penso que a senha mais forte é também a mais simples e está dentro de nós. A senha do coração, não pelo fato de ser um órgão vital, mas sim pelo sentimento que carregamos nele. O segredo para uma vida segura, não está na complexidadede  e na dificuldade para os outros e sim na simplicidade de ações e atitudes, exemplos deixado por Jesus, há mais de 2000 anos. Através da senha do coração, ele mostrou que caminho para acessar a felicidade é compartilhar a sua senha com outros. Entre todas as senhas, a do coração nos ajuda a ser inviolável e conviver com todas as outras.

Marco Medronha   mmedronha@hotmail.com

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Uma vez pato...


Quem são estes indivíduos carentes em reviver momentos de quando a vida era uma incógnita? Digo que eram um bando de sonhadores, que viviam contrariados com o regime, criaturas aladas forjadas pela disciplina. Em tempos de escassez de recursos, sobrava juventude e muito companheirismo. São patos, uma classe migratória com talentos multiculturais espalhados pelo mundo, lideranças formadas para construir realidades.
Os patos não esquecem suas origens, procuram estar junto em pequenos grupos e, a fim manter os laços de amizades realizam pequenas reuniões com freqüência. Eventualmente, quando a saudade aperta o bando de patos promove encontros é o momento especial para que cada membro do grupo mantenha acesa a chama que o tempo insiste em transformar. No encontro deste mês de novembro (24), em Pelotas, os velhos patos, alguns avós, reviveram o jargão: Uma vez pato, sempre pato!
O pato é o símbolo do Conjunto Agrotécnico Visconde da Graça, escola que tradicionalmente, formou profissionais das ciências agrárias e da economia doméstica rural teve origem em outubro de 1923, sob a denominação de “Patronato Agrícola do RS”. Atualmente é o Campus Pelotas – Visconde da Graça (CAVG), um dos Campi vinculado ao Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul), instituição de Educação Profissional Técnica de Nível Médio e Superior de Graduação e Pós-graduação.
O encontro dos ex-alunos, a maioria egressos no início da década de 70, reuniu profissionais ainda em atuação de várias áreas como: direito, comunicação, agronomia, veterinária, letras e várias outras profissões. Muitos atuam como professores, políticos, empresários ou profissionais liberais. Em comum a convivência escolar no regime de internato e rica experiência da escola, realmente, de tempo integral. São pessoas que fazem parte de um bando vencedor. Eles têm rosto, nome e endereço, mas aqui uma só identidade: Pato.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O porco que encontrou água











Ilustração:
Wilmar Marques






Em tempos difíceis de estiagens, as pessoas se dão conta que é preciso reservar, economizar, fazer uso racional dos recursos hídricos. Nós conhecemos a velha máxima e, por vezes sempre atual: “Se dá valor a um bem quando não se tem”. Isto acontece com muitas coisas, mas com frequência quando o assunto é o bem mais precioso da natureza, a água.

Contei recentemente a história real do mago da forquilha, personagem conhecido no interior dos municípios, que com uma varinha, quase mágica, encontra água subterrânea para cavar poços. Dia desses conheci o relato de um agricultor de Pedro Osório, ele falou sobre a falta de chuva e as dificuldades que encontrava para irrigar as plantas desidratadas, água boa principalmente para o consumo humano e para os animais de criação.

Quando a situação estava muito ruim, quase insustentável, um dos porcos fugiu do chiqueiro e começou a fuçar a terra desesperadamente. A surpresa do agricultor foi grande quando encontrou o porco fujão banhando-se em uma poça d’água, lameado de barro. Ao contrário que muita gente pensa, o porco não é burro, seu intelecto é comparável ao dos golfinhos, elefantes e primatas superiores, um degrau acima do cachorro.

Pois bem, o porco utiliza sua inteligência natural não só para encontrar água, também na sociabilidade. Na natureza, por exemplo, eles se dividem em pequenos grupos liderados pela fêmea, em que a hierarquia da líder é exercida de forma linear, sem sobreposições de papéis, onde cada indivíduo ocupa um determinado espaço. Muito provavelmente, o porco encontrou água pelo desempenho extraordinário do seu olfato, capaz de farejar predadores cerca de um quilometro de distância e objetos a trinta centímetros de profundidade.

O focinho tipo tomada, que todo mundo acha engraçado, quando toca alguém com o nariz é para manifestar afeto, reconhecer um amigo ou manipular objetos, os porcos adoram brincar. Além do mais, o porco não é porco, ele não gosta de sujeira e, por natureza é muito asseado. Os porcos para aliviar o calor recorrem aos banhos de lama quando não há disponibilidade de água limpa e fresca. A lama também serve para livrá-los de alguns parasitas causadores de doenças.

Então amigos e amigas, o fato do porco encontrar água não é nenhuma surpresa. Afinal, com tantas qualidades do bichano é sensato a gente repensar nossos conceitos sobre os porcos e tudo que falam deles. Talvez, quando alguém falar em “espírito de porco”, teremos que avaliar melhor o sentido.

Marco Medronha   mmedronha@hotmail.com

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O mago da forquilha


                                                                 Ilustração: Wilmar Marques
Quem tem um pé na roça por certo já ouviu histórias ou acompanhou a batalha das famílias rurais para encontrar água subterrânea. Mesmo os que possuem recursos para investir na construção de um poço artesiano (aquífero profundo), precisam saber qual o melhor local para cavar. Lembro claramente de um homem franzino que morava no município de Cristal, seu Alcidinho, era um craque para encontrar água e ordenar a abertura de poços.
Ele usava apenas uma vara em forma de forquilha, com a ponta para cima, enquanto as duas mãos fechadas e invertidas (palmas para fora) seguravam o instrumento como se fosse um “V” invertido. Na medida em que se aproximava do “veio d’água”, a forquilha inclinava-se para baixo, envergando-se e mostrando o lugar certo para cavar. Seu Alcidinho, convicto dizia: - É aqui... Pode cavar o poço.
A água lá de casa foi encontrada por ele, assim como os poços da maioria dos primeiros habitantes (cerca de 300) da Vila Cristal, antes da água encanada. O mago da varinha d’água, por certo é uma dessas personagens rurais dotadas de sensibilidade, do pequeno grupo da radiestesia, termo de origem grega significa “sensibilidade às radiações”. São pessoas têm a capacidade de perceber, inconscientemente, as radiações do ambiente, como as que são produzidas pela água em movimento. “Elas geram impulsos musculares que acabam se refletindo na forquilha", afirma Sérgio Areia, presidente da Associação Brasileira de Radiestesia (Abrad).
Cada tecnologia tem seu tempo e lugar, o talento do seu Alcidinho para encontrar água hoje, certamente não teria muita serventia nos lugares em que existe água potável, encanada e que não é necessário cavar, apenas abrir a torneira. Talvez no interior dos municípios, onde os poços ainda são preciosas fontes de abastecimento de água para beber. Basta saber se o “mago da forquilha” deixou seus discípulos.

Marco Medronha   mmedronha@hotmail.com