Ilustração: Wilmar Marques
No sul do Brasil, na Argentina e no Uruguai, a caturrita é considerada praga em zonas de cultivo de milho e sorgo ou em pomares. As aves da família do periquito, com o desaparecimento das matas onde viviam, começaram a procurar alimento nas plantações que hoje ocupam seu habitat natural. A extinção progressiva de seus predadores, a exemplo do gavião, e o alimento fácil encontrado nas lavouras fizeram a população aumentar com facilidade.
A ótima capacidade de adaptação a qualquer mudança provocada pelo homem e o aumento das florestas de eucalipto foram fatores decisivos para a proliferação da espécie. A myiopsitta monachus, vulgo caturrita passou a ser um dos problemas sérios para a agricultura e uma dor de cabeça para agricultores e técnicos.
A tirania do bicho mexeu com os brios da pesquisa, o então pesquisador da Embrapa Clima Temperado, Eliezer Winkler desenvolveu uma forma de controle ecológica, um espantalho do tipo pandorga ou pipa em formato de gavião, seu predador natural. A pipa-gavião era feita com plástico preto, aquele utilizado na cobertura de canteiros de hortas, o espantalho funciona como um móbile, movimentando-se com a ação do vento e espantando as caturritas.
O Terra Sul, programa de
televisão realizado pela parceria Emater/RS e Embrapa, com reportagens focadas
no desenvolvimento regional teria, logicamente, que produzir uma matéria
mostrando a situação. Seguindo a velha e eficiente fórmula de produzir qualquer
material jornalístico, a equipe de produção colocou em prática um esquema
infalível para fazer uma boa reportagem: identificou o problema = caturrita; a causa
= desmatamento; a ou as conseqüência(s) = prejuízo na lavoura; a ou as alternativa(s)
= pipa-gavião.
A equipe saiu a campo para produzir a reportagem na companhia do pesquisador, a fonte número 1, considerada a principal numa entrevista. O Eliezer estava junto e tudo foi acontecendo normalmente na gravação das imagens. Seguiram os depoimentos dos produtores prejudicados, dos técnicos, da pesquisa, lavouras danificadas, desmatamentos, vôos da caturrita sobre as plantações e a pipa-gavião ao vento guardando as espigas de milho, mas nada de conseguir a cena principal: As aves comendo o milho, destruindo a lavoura. O dia acabou e não foi possível fazer a imagem da caturrita comendo milho.
No dia seguinte começamos a edição do material sabendo que faltava algo para completar a matéria. Alguém deu a sugestão de colocar alguns pés de milho no estúdio, com a palha aberta e com os grãos aparecendo. Foi uma idéia maluca, mas que foi colocada em prática, não havia tempo para sair e produzir a cena, as caturritas voavam em bando, eram ariscas e estavam a quilômetros. Nossa sorte foi que, alguns moradores próximos da Embrapa, tinham as conhecidas “cocótas” em casa e nem estavam presas em gaiolas, pois eram mansinhas e alfabetizadas, falavam palavrões fluentemente.
Pois bem... Ligamos as câmeras e deixamos os bichinhos à vontade sobre os grãos de milho, elas (cocótas/caturritas) deliciaram-se e assim ficou mais completa a matéria de TV, embora não tenha sido a saída ideal, pois nada substitui a situação real na lavoura, como realmente acontece.
De tudo isso, fica a lição do improviso e da criatividade, na época utilizamos o recurso do croma kei ou cromaqui. “Fizemos assim: colocamos quatro ou cinco pés de milho em frente uma grande tela azul, que pode ser verde, depois da gravação a tela pode substituída ser por imagens ‘ilha de edição”, no caso por uma lavoura de milho em ponto de colheita. Tais efeitos ainda são muito utilizados na televisão, agora com a ajuda do computador, esses retoques produzem efeitos visuais que ajudam a criar universos fantásticos e perfeitos, tornando tudo mais verossímil e mais divertido para o espectador.
Marco Medronha mmedronha@hotmail.com
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