quinta-feira, 5 de novembro de 2015

As crianças lá do campo

                                                                Foto: Felipe Brandão

Naqueles dias chuvosos bate uma nostalgia gostosa das lembranças e saudades dos tempos de criança lá no campo. Lembro-me dos amigos de infância e da vontade que tínhamos em brincar, tempos em que divertido era correr, entrar na chuva para se molhar e se atirar de carrinho nas poças d’água depois de uma chuva de verão. O risco era chegar em casa quase a noitinha, cansado de tanto gastar energias e receber um dolorido puxão de orelhas pela roupa molhada e embarrada.


Será que valeu à pena? Tenho certeza que sim. As crianças lá do campo provavelmente eram mais felizes porque tinham a natureza e a inocência como aliados e seus pais eram rigorosos na educação dos filhos. Eu, particularmente nunca apanhei, pois era do grupo dos mais comportados ou daqueles que sabiam fazer a arte na hora certa, tipo “sorrateiro”, no bom sentido. Nem todos tinham a mesma sorte, a disciplinadora varinha de marmelo, com frequência   riscava as pernas dos calças curtas.


Mesmo que todas as crianças sejam imaginativas, algumas poucas brincadeiras eram parecidas com aquelas da gurizada da cidade, talvez o jogo de bola, com uma diferença: os do meio rural jogavam com os pés descalços, o tal de tênis era artigo de luxo. Subir em árvores e tomar banho de açude foram minhas artes preferidas, mesmo quando as pernas ficavam tapadas de sanguessugas e tinha que arrancar com os dedos uma por uma. Pra quem não sabe, a sanguessuga é um anelídeo, animal hermafrodita, que possui ventosas e se alimentam geralmente de sangue. No Rio Grande do Sul, os guris do campo chamam de “chamichungas”.


Bah... Mas isso era saudável?  Claro, no meio rural existe um universo imaginativo para as crianças explorarem o faz-de-conta e tudo que existe na natureza possui seu fundamento, aprendi que para qualquer enfermidade ou machucado dos arteiros, ali mesmo nos campos, rios e florestas existe o tratamento adequado, mesmo a grudenta chamichunga é utilizada pela gente da cidade, nos tratamentos medicinais, estéticos e terapêuticos.


Mas os tempos mudaram e atualmente até os meninos do campo estão se esquecendo das brincadeiras e aderindo a modernidade das novas tecnologias. Recentemente, entrevistando alguns pais do meio rural, que nem e-mail possuem ou conhecem, todos relataram que os filhos possuem um perfil no Facebook e, que o Nintendo, o X-Box, o Playstation e outros jogos eletrônicos mais atuais que a moçada conhece, já estão ultrapassados. 


Fiquei realmente preocupado. Será que os meninos do campo estão virando marionetes da tecnologia e estão entregando suas vidas ao controle sem fio e sem volta dos jogos eletrônicos? Se isso estiver acontecendo, certamente vão estar perdendo o encanto de ser criança, daquela que ao abrir a janela reconhece o canto dos pássaros. Acredito que cabe aos pais impor limites e mostrar, que os “bips” são sons forjados pela indústria alienante e que é bom ser criança lá no campo.




Marco Medronha     mmedronha@hotmail.com

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