O litoral gaúcho apresenta diversidade de manifestações culturais, onde diferentes heranças são reveladas através da mistura étnica e tradições preservadas nas comunidades, muitas vezes esquecidas. Entre as quais estão os Ternos de Reis, Festas Juninas, Cantos Fandanguistas, Folias do Divino, Quicumbis, Ensaios, Embaixadas e Moçambiques.
O culto às tradições populares resiste, pelo hábito das comunidades em cultivar o respeito aos antepassados e reunir a família de torno de uma identidade. Uma grande riqueza de manifestações populares estão escondidas nos quilombos. Em Mostarda, na comunidade de Casca, conheci o mestre Antônio, um abnegado que por várias décadas comanda um Terno de Reis. Entre amigos e parentes, os músicos entoam noite adentro, cantigas de religiosidade com mensagens de amor, respeito e gratidão.
Lembro bem disso. Meu pai era cantador de Terno de Reis, no início do vilarejo que nasceu nas margens do Rio Camaquã, hoje Cristal. As cantigas eram parecidas com algumas variações, na letra, mas era a mesma batida do tambor, do pandeiro, gaita e violão. Eles cantavam até o dono da casa abrir a porta, normalmente quando a galinha ou arroz com lingüiça estivesse pronto, eles entravam e com alegria faziam uma grande confraternização.
Sem querer ser saudosista e ao mesmo tempo sendo, naqueles tempos o valor de um vizinho era diferente. Tinha um sentido diferente, os poucos recursos se somavam e sobrava solidariedade. Também lembro que havia mais compadres e comadres, os afilhados referenciavam beijando a mão do padrinho ou da madrinha. Achava aquilo muito bonito e aprendi desde cedo a ter respeito pelos aos mais velhos.
Recentemente conheci a cultura misturada dos açorianos e afrodescendentes no litoral gaúcho. Embora com ritmo musical diferente, o que é natural, o culto e gratidão a experiência é valorizada. Nos quilombos os Ensaios são mais que festividades, caracterizam-se como formas de agradecimento pela vida na comunidade, momentos carregados de alegria e sentimento, expressões tão raras no mundo potencialmente evoluído das cidades.
Marco Medronha mmedronha@hotmail.com